Cooperados cultivam mel, propólis, frutas, horta urbana e projetam para fim de 2023 a instalação de uma unidade industrial de biocosméticos a partir de plantas originárias do bioma da Mata Atlântica e ecossistemas de manguezais.
A história da Cooperativa Agrícola de Assistência Técnica e Serviços (Cooates), no município de Barreiros, Zona da Mata Sul de Pernambuco, se entrelaça com a crise do setor sucroalcooleiro naquela região específica, nos idos de 1996, quando a usina Central Barreiros, a maior do Estado, encerrou suas atividades devido a uma série de fatores, como a concorrência internacional, a crise do açúcar e a falta de investimentos.
Naquela época, em 1996, o atual presidente da Cooates, José Cláudio da Silva, era aluno do curso da Escola Agrotécnica Federal de Barreiros e demonstrava interesse no cooperativismo. A partir daquele momento, a jornada dava início e as coincidências para os então jovens alunos começaram a surgir.
José Cláudio e mais alguns colegas já formados como técnicos em Agropecuária foram aprender na roça, em um assentamento de uma cooperativa em Alagoas, sob gestão do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra ( MST).
Nascia ali, em 1999, após aprender com outros cooperados, o sonho de retornar a Barreiros, município inserido no bioma da Mata Atlântica, em Pernambuco, e investir no Cooperativismo.
Coincidências e destino
A fundação da Cooates foi no ano 2000, em uma data histórica: 13 de maio, a qual se celebra a data de libertação dos escravos. Naquele ano, a pequena sede ainda provisória funcionava em um espaço na casa de um dos 20 cooperados na cidade de Barreiros.
“O início foi muito difícil. Tínhamos que ir para Recife participar dos cursos na Ocepe, hoje, a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB/PE) além de manter contato com pessoas interessadas em nossos serviços. Pegávamos carona em ambulância, com apenas o dinheiro do lanche”, conta José Cláudio da Silva, que, chegou a cortar cana na Usina Central Barreiros, com seu pai Manoel Mariano da Silva.

Mas, como dito anteriormente, as coincidências acontecem e o destino dá voltas. Isso porque, no presente, o solo que antes abrigava uma das maiores produtoras do setor sucroalcooleiro, nos idos de 1960, no Brasil, abriga na atualidade a sede oficial da Cooates.
Os cooperados adquiriram a propriedade de oito hectares, por meio de leilão, em 2021.
De lá para cá, os projetos erguidos entre as ruínas do prédio histórico da Central Barreiros e nas terras são diversificados e mostram o quanto aquele grupo pequeno de 20 famílias cresceu e atualmente mais de 70 pessoas diretamente sobrevivem da então massa falida da Usina.
Além das fronteiras
A determinação de tornar a produção de mel produzido em dois apiários próprios, um em uma área da Mata Atlântica e outro em área de manguezal, e também de outro fornecedor, no município de Moreilândia, no bioma da Caatinga, faz da Cooates, uma das cooperativas com diferenciais na qualidade e na forma como cultivam as abelhas da espécie Apis mellifera (com ferrão).
O especialista em Apicultura, formado em Zootecnia pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Otávio Leandro, é o responsável pelos apiários junto com o também presidente da Cooates, com especialização em Gestão Ambiental , José Cláudio da Silva.
“Aqui todo mundo põe a mão na massa. A biodiversidade existente em nossos apiários fazem de nosso mel e derivados um dos melhores do Estado”, avalia José Cláudio.

A Cooates produz hoje seis toneladas por ano de mel puro de abelha, em diferentes versões e sabores de produtos para os consumidores.
O mel proveniente da Caatinga, tem no seu sabor um pouco mais de acidez, já que a maioria das colméias se alimentam de uma espécie, conhecida por Cipó de uva.
Já o mel e derivados provenientes das colméias da Mata Atlântica e ecossistemas como manguezais são mais adocicados.
“São sabores únicos. E também o que nos diferencia é o manejo ao qual implementamos em nossos apiários, com análise pela Embrapa Meio Norte -Piauí. A atuação da equipe da unidade do Vale do Una é detalhista, quando os enxames são retirados adequadamente e destinados aos apiários da cooperativa. O processo começa com a identificação e remoção da abelha rainha e, a partir daí, todas as demais abelhas seguem para o novo local. Toda nossa produção é comercializada no mercado interno, mas estamos em processo de exportação para países como Emirados Árabes e Coreia do Sul”, adianta o gestor.
Além do puro mel de abelha, a cooperativa produz o própolis vermelho, originário dos manguezais de Barreiros, em uma usina com capacidade de processar em torno de 300 litros de própolis vermelho a cada três dias, conforme a demanda. “Se tiver demanda, a gente processa”.
Exportação
A etapa de exportação de toda a produção da Cooates Vale do Una, entretanto, está em tratativas, por meio do programa de exportação viabilizado por meio de acordo entre a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB) e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex Brasil), vinculada ao Ministério das Relações Exteriores.
A formação para a cooperativa aconteceu dentro do Programação de Capacitação e
Exportação da Apex Brasil (PEIEX), que atende, atualmente, 25 cooperativas em todo o País, entre as quais a Cooates Vale do Una. A ideia dessa capacitação, que possui duração entre 3 e 6 meses, é preparar as cooperativas para ingressarem no mercado internacional.
A ex-usina em transformação
No pouco que restou da construção secular da Usina Central Barreiros, a Cooates vem mudando a cara do lugar.
A partir da necessidade de estocagem da produção do mel, onde antes era armazenado o melaço proveniente da antiga produção de cana-de açúcar, deu espaço para guardar produtos derivados da abelha.
Nos velhos galpões, a cooperativa construiu uma composteira e viveiros educador para desenvolvimento de ações de educação ambiental com a comunidade local
“Onde se tinha um lavatório para lavar as canas para em seguida ir para moagem, vamos transformar em um futuro próximo em uma criação de piscicultura de tilápia, assim como na área das máquinas, em uma fábrica de filetagem de tilápia. Então, estamos tentando retomar toda essa parte industrial do município de Barreiros que perdeu ao longo do tempo. Retomar toda essa história, todo esse trabalho, com muita ação, com muito suor e muitas mãos envolvidas”, diz o presidente da Cooates.
Unidade industrial de Biocosméticos
Mas, como o tempo não para, a Cooates Vale do Una já conseguiu, por meio de parcerias com especialistas e universidades, a instalação de uma unidade de biocosméticos em Barreiros.
Os investimentos previstos são de R$1,5 milhões, com contrapartida de R4 450 mil da Agência de Desenvolvimento de Pernambuco (ADEPE) e o restante investimento próprio da cooperativa.
A autorização está em processo pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
A unidade vai funcionar, com previsão de inauguração para final deste ano, na antiga casa de hóspedes da usina Central de Barreiros.
“Estamos reutilizando os espaços, estruturando o local, em uma unidade de beneficiamento de biocosméticos, com áreas destinadas às pesquisas, laboratórios e processamento”, revela o cooperado.
Hub de Produtos e Serviços
Como o próprio gestor da cooperativa define, a Cooates funciona hoje como um hub de produtos e serviços para o setor agropecuário.
Para os próximos projetos da Cooates incluem também os cultivos de cacau e açaí, frutas que já se adaptaram ao território.
“Estamos em fase de pesquisa, com cultivo de viveiros de mudas, aprimorando o solo e adequação às áreas em torno de nossa sede”.
Para além disso, os cooperados já estudam a instalação de uma usina de beneficiamento e processamento de biodiesel, à base do óleo de coco, em parceria com o ex-secretário estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade, José Bertotti.
“Projetos que estão à frente e , em consonância, com a necessidade do planeta frente à urgência de transição energética para uma matriz limpa”. Há também projeto de instalação de uma planta de h2V (Hidrogênio Verde). Estudos técnicos devem ser iniciados em 2024.
“Temos também em nosso portfólio a prestação de serviços em Assistência Técnica em Agropecuária e Extensão Rural, a partir de projetos de reflorestamento ambiental para empresas como Suape, Compesa, Anater, em Brasília. Aqui em nossa própria sede temos uma área dedicada a viveiros de mudas do bioma Mata Atlântica para reflorestar áreas das matas ciliares no entorno do Rio Una e no futuro próximo investir no turismo de experiência e educacional”, finaliza.
- *Conteúdo especial produzido pela jornalista Luciana Leão, editora do EJ, em colaboração com a Revista Nordeste edição setembro número 200.