Olavo Nogueira Filho, diretor-Executivo do Instituto Todos pela Educação considera que exemplos de perseverança e compromisso com a Educação vêm justamente de alguns estados do Nordeste, como o Ceará, Alagoas, Pernambuco e Piauí, em especial a capital Teresina, primeiro lugar entre as capitais, no Ideb 2021
A declaração do presidente da República Jair Bolsonaro (PL) de que o “povo nordestino é analfabeto” com intuito de justificar a baixa adesão eleitoral para sua reeleição na Região Nordeste no primeiro turno do pleito “é uma generalização que não se sustenta em dados”, segundo destaca Olavo Nogueira Filho, diretor-Executivo do Instituto Todos pela Educação, entidade sem fins lucrativos, reconhecida mundialmente pelo trabalho em prol de uma educação inclusiva, de qualidade para todas as crianças e jovens do país.
Em entrevista exclusiva à Revista Nordeste, Olavo se detém em analisar os mais recentes levantamentos do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).
O Ideb foi criado em 2007, no então governo Lula (2003-2010) e se configura como uma das primeiras iniciativas no país a medir a qualidade do aprendizado, em âmbito nacional, e estabelecer metas para a melhoria do ensino. Trata-se de um dado concreto que possibilita à sociedade se mobilizar por avanços e que é composto por duas dimensões: o índice de rendimento escolar – que é a média das taxas de aprovação do ciclo avaliando — e a média de desempenho no Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica).
O analfabetismo na Região Nordeste gira em torno de pouco mais de 10%, aponta o executivo. “Sem dúvida é um dado que não orgulha ninguém, mas generalizar em cima desse percentual é ignorância ou preconceito. Ou talvez os dois. Além disso, é preciso dizer que esse quadro não é culpa da população nordestina. Isso é, fundamentalmente, resultado de um descaso histórico do país com a educação pública. Descaso este, inclusive, que operou de forma desigual no Brasil, afetando mais as regiões norte e nordeste”.
Entretanto, complementa Olavo Nogueira Filho, o atual presidente desconhece que o percentual de analfabetos vem caindo sistematicamente ao longo dos últimos anos em todas as regiões, sem exceção. “Em 1960, 40% da população brasileira acima de 15 anos era analfabeta”, lembra. “Hoje, a realidade é outra. Isso foi fruto de políticas públicas que colocaram todas as crianças na escola, do trabalho de muitos profissionais da educação ao longo das últimas décadas e do esforço de muitos jovens e adultos que apenas recentemente tiveram a chance de se alfabetizar”, reforça.
Nordeste é “farol” para o Brasil

Exemplos de perseverança e compromisso com a Educação vêm justamente de alguns estados do Nordeste, como o Ceará, Alagoas, Pernambuco e Piauí, em especial a capital Teresina, primeiro lugar entre as capitais, no Ideb 2021, em meio a um cenário conturbado de pandemia.
“É mais do que isso: os melhores exemplos têm vindo do Nordeste e eles já se tornaram modelo para outros estados. Os casos cearense, na alfabetização, e o pernambucano, no ensino médio, já estão sendo adaptados e replicados por inúmeros estados Brasil a fora. São modelos de política pública muito bem formulados e implementados, que conseguem perseverar em contextos adversos do ponto de vista socioeconômico. Não é pouca coisa não. E se você vai pra esfera municipal, tem Teresina, no Piauí, que tem os melhores resultados no ensino público entre todas as capitais brasileiras; tem Coruripe, em Alagoas, que está virando a nova “Sobral”. Então sem exagero algum: o Nordeste, hoje, é referência, é farol. É o Nordeste que está ensinando o resto do País sobre como fazer educação de qualidade”.
Na opinião do diretor-Executivo do instituto Todos pela Educação, as experiências exitosas no Nordeste, mesmo com patamares de investimento inferiores aos observados em outras localidades brasileiras, é possível fazer educação de boa qualidade, fruto da combinação investimento e boa gestão. “Há que se ter cuidado com a ideia de que recursos não fazem a diferença. Fazem sim e nos casos de maior efetividade no Nordeste houve prioridade orçamentária”.
Para uma virada educacional em todo o país, tornando uma nação mais equilibrada e com oportunidades similares para todos, deve-se levar em conta que o Brasil sendo um país com dimensões continentais, federativo e muito desigual só terá avanço em escala nacional com a redução de desigualdades e se o governo federal entrar em campo e coordenar o esforço, avalia Nogueira Filho.

“O atual governo, que é anti-política pública, que é anti-federação, inacreditavelmente abdicou dessa função. Então com Bolsonaro não há chances de termos uma educação melhor. Se der Lula nesse 2º turno, aí o quadro pode ser diferente, pois a visão é outra. E aí nós entendemos que são dois grandes desafios. O primeiro é enfrentar, junto com os estados e municípios, os impactos imediatos que a pandemia trouxe à vida dos estudantes”, acrescenta.
É de conhecimento que a pandemia pode ter acabado, mas os efeitos dela ainda permeiam pelos quatro cantos do país. Efeitos, diz o executivo, “extrapolam a escola, como alimentação e saúde emocional. Mas é claro, efeitos educacionais, como abandono escolar e aprendizagem”.
Em sua avaliação, com base em dados, o próximo governo federal precisa fazer algo que inexiste no momento: liderar uma ação nacional emergencial de recuperação pós-pandemia, articulada aos Estados e Municípios.
“As duas notícias mais otimistas são que (i) dá pra recuperar e (ii) tem alguns estados e municípios fazendo ótimos trabalhos, então tem pra onde olhar e se inspirar”.
O segundo grande desafio é o de retomar uma agenda de melhorias estruturais das políticas públicas educacionais. “O que estamos falando aqui é temos que avançar medidas, em território nacional, que consigam ajudar as escolas a melhorarem a sua qualidade. Aqui as experiências do Nordeste, que destaquei há pouco, são centrais, pois são referência”, destaca.
O país não é cenário de terra arrasada
“O Brasil avançou bastante em educação nos últimos 30 anos, nós não estamos num cenário de terra arrasada, mas o diagnóstico é claro: 2019, pré-pandemia, apenas 10% dos estudantes que concluíam o ensino médio tinham aprendido bem matemática. Avançar rumo a uma educação de melhor qualidade, passa, por exemplo, pela expansão das escolas em tempo integral, que hoje são apenas 15 em cada 100 escolas no Brasil. Mas passa, fundamentalmente, pelo entendimento de que os professores e as professores são a solução, e não o problema”.
Então, reforça Nogueira Filho, tem que investir na formação, na melhoria das carreiras e nas condições de trabalho. “E nessa seara, um governo federal realmente comprometido com a educação, com os assuntos que de fato importam, pode fazer muita coisa”.
Melhoria passa por políticas públicas
Em sua essência e missão, o Todos pela Educação parte da premissa de que a verdadeira independência do Brasil só virá quando o País alcançar uma educação de qualidade para todas as crianças e jovens.
“E num país como um nosso, melhorar substancialmente a educação passa por termos boas políticas públicas, bem implementadas e sustentadas ao longo do tempo. Então, no Todos, nossa missão é trabalhar para que isso aconteça, sabendo, é claro, que não temos a caneta da mão. O que fazemos é incidência técnico-política, ancorada nas melhores evidências disponíveis e de forma suprapartidária”.
Essa incidência, explica, se expressa em quatro frentes de ação: colocar e qualificar o tema da educação no debate público, monitorar publicamente os dados e os resultados educacionais, produzir recomendações de políticas públicas e articular diretamente com o poder público para fazer com que essas propostas cheguem nas mãos dos tomadores de decisão.
Exemplo disso é a aprovação do Novo Fundeb que, na sua opinião, traz um escopo maior e mais redistributivo. “ É o exemplo mais fresco de uma política educacional estrutural que tem a nossa digital. Produzimos muito conhecimento para contribuir com o novo desenho, participamos ativamente das discussões e articulamos dezenas de atores-chave para que saísse da forma como saiu. Foi um marco que expressa bem a essência do nosso trabalho”.
*Matéria originalmente publicada na edição 189, de outubro 2022, da Revista Nordeste produzida e escrita pela editora e jornalista do EJ, Luciana Leão e você pode ler aqui nesse link:?
https://www.mflip.com.br//pub/NORDESTE/index.jsp?edicao=11881&code=1666137528712#page/1
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